Os novos muros de "Berlim".
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Nos anos 80 fui colocado numa "velha" companhia da raia terrestre alentejana da, então, muito prestigiada Guarda Fiscal - comparando, claro está, com a, então, mais que obsoleta GNR, que ainda andava de mauser, camisa verde exército, e polainas - O refeitório dessa companhia era uma sala ampla de tectos altos e trabalhados, com grandes janelas donde se podia observar, enquanto comíamos, a bela planíce alentejana.
Nos anos 80 fui colocado numa "velha" companhia da raia terrestre alentejana da, então, muito prestigiada Guarda Fiscal - comparando, claro está, com a, então, mais que obsoleta GNR, que ainda andava de mauser, camisa verde exército, e polainas - O refeitório dessa companhia era uma sala ampla de tectos altos e trabalhados, com grandes janelas donde se podia observar, enquanto comíamos, a bela planíce alentejana.
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A comida era óptima, bem confeccionada, e a sala cheirava a "asseio". Nas paredes, havia umas reproduções de uns quadros de alguns pintores portugueses. Recordo apenas o nome de um desses artistas, a já falecida Vieira da Silva e no seu quadro constava o seguinte dizer: " A POESIA ESTÁ NA RUA", numa clara alusão à revolução dos Cravos.
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Nessa messe alentejana almoçava o nosso capitão, comandante de companhia, os sargentos e os guardas.Normalmente o capitão almoçava numa nas mesas redondas com alguns sargentos e o cabo mais velho, outras vezes juntavam-se também a mulher ou filhos dos ditos que com eles almoçavam.
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Nós, os guardas, almoçávamos nas outras mesas na companhia dos outros sargentos e, casualmente, com alguns dos nossos familiares.
Nós, os guardas, almoçávamos nas outras mesas na companhia dos outros sargentos e, casualmente, com alguns dos nossos familiares.
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Com o devido respeito, dentro do horário e de acordo com o serviço a desempenhar, cada um almoçava livremente sem ter que andar a pedir "licenças" para iniciar a refeição, etc.etc.
Com o devido respeito, dentro do horário e de acordo com o serviço a desempenhar, cada um almoçava livremente sem ter que andar a pedir "licenças" para iniciar a refeição, etc.etc.
No tempo das férias escolares era costume haver bastantes miudos , nossos filhos, a almoçar. O cabo responsável da messe colocava-os todos numa mesa. Era os filhos do capitão, eram os dos sargentos, eram os dos guardas, todos almoçavam juntos e por ali passavam as tardes na brincadeira.
1993: Extinção da Guarda Fiscal.
No início de 1994, com alguma admiração, vimos começar a levantar-se um muro de tijolo na velha sala da messe. Segundo se dizia, por obrigação do comando da GNR o Comandante de Compahia teria de fazer as suas refeições separado do resto do efectivo. E assim foi, o novo CMDT passou a comer isolado ou na companhia da esposa/filhos ou amigos. Os filhos do sr. tenente já não almoçavam com os filhos dos guardas e dos sargentos.
2008 é extinta a Brigada Fiscal e as instalações passam para o dispositivo territorial, sem o desejar transito também para o territorial.
Janeiro de 2010, por pressão dos sargentos, novo muro de tijolo se levanta na velha messe única dos guarda fiscais. Estava criada a messe para a meia dúzia de sargentos.
Quando vi a minha filha, de tabuleiro na mão, parada no meio da sala dos guardas a observar, pela porta aberta da messe do oficial, demoradamente, o Pires "cozinheiro" a servir a sopa à filha do sr. capitão, que por acaso até anda na mesma universidade ( Évora) que a minha rapariga, senti-me envorganhado, primeiro, enojado, depois.
Nunca mais, mesmo de serviço, comi naquela messe. Nem nunca mais a minha filha entrou naquele quartel.
Nada mais humilhante que veremos os nossos filhos segregados, como práticamente, já só acontece na GNR.
Ironia do destino: uma Guarda que foi criada para defender os valores republicados da Igualdade, Fratenidade e Liberdade, mas que ainda espelha a velha sociedade medieval.
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enviado por "um Camarada"
fonte desconhecida
Sou filha de um Guarda Fiscal, aliás da extinta Guarda Fiscal e entendo bem o que esse "camarada" diz...sei o que é almoçar na mesa do capitão, sendo o meu pai um simples Guarda, era uma diversão autêntica...Saudades desses tempos bem passados...
ResponderEliminarEnquanto militares das Forças de Segurança, este desabafo faz-nos reflectir um bocado sobre a questão dos nossos valores existenciais e quais os ideais!
ResponderEliminarDiferenças Institucionais e existenciais, onde a nossa GNR aparece sempre com velho mundo, carregando esses ideais de doutrina castrense, e em que o novo mundo está consequentemente a ter problemas com essa concepção arcaica e estigmatizante.
Continuamos a ter uma categoria de topo pouco sensível, cujas relações pessoais com a da base são bem diferentes das que existem em outras instituições policiais, um exercício de comando perpetuado por pessoas demasiado egocêntricas, absortas, extasiadas, em que o mais importante para eles é ir corporificando sempre os seus ideais em detrimento dos de outros!
O ideal era uma hierarquização mais empírica assente numa cultura de valores humanos, consubstancializados no Estado democrático e de direito.
Ao ler estes comentários fico realmente com a sensação que ainda existem muitas desigualdades na GNR, mas talvez fiquem um pouco estupefactos quando o comandante de uma Unidade da GNR, proíbe um Sargento Mor de jogar o dominó com os guardas e de os saregenntos jogarem as cartas com os referidos guardas. Isto ainda acontece na Guarda Nacional Republicana.
ResponderEliminarDá para pensar.....
17FEV11